terça-feira, 5 de janeiro de 2016

4 - NORTE DE POETA




Não sei se acontece com toda a gente, mas, comigo, sempre acaba por chegar um momento em que as palavras ficam menores do que eu preciso, e tudo o que escrevo parece nunca chegar perto do que queria dizer realmente, ou a realmente fazer-lhe jus.

Com isso, por sorte, o mundo continua longe de ter descrições definitivas para a maior parte das coisas, o que, convenhamos, é um privilégio.

Por sorte maior ainda, e desejavelmente com mais sucesso que eu, os poetas podem continuar o seu trabalho fantástico de tornar visível a todos a beleza de coisas  que, sem eles, tantas vezes não passariam de trivialidades e lugares-comuns.

Mas, no meu caso, da mesma forma que atravesso momentos em que  as palavras parecem sempre ficar aquém do necessário, também atravesso outros em que sinto que elas tomam o freio nos dentes e, numa correria difícil de controlar, saem por aí em ganhos de eficiência. De tal forma que parecem aumentar tanto os seus significados possíveis, que novas portas, para novas idéias, se abrem como convites - a mais e mais palavras...

A coisa fica ainda pior quando se torna visível o silêncio dos outros, quando um sub-reptício bocejo acontece, ou quando uma mirada disfarçada ao relógio revela uma mal contida ansiedade por espaços mais abertos, capaz de, por si mesma, gerar desatenções e menores cuidados. Vale, então, pesar o que digo e o que me é dito, e avaliar reciprocidades.

Essa é a hora em que preciso parar,  redefinir rumos,  avaliar a isenção com que me avalio. Nasce assim o momento frágil, sensível ao beijo como ao látego, em que os caminhos tantas vezes percorridos, são postos em questão, e torna-se realmente necessário definir como seguir em frente, e de que maneira.

E se procuro me arrepender o menos possível do que digo ou faço, também não é menos verdade que necessito monitorar-me, aferir-me com freqüência, e creio até ser visível na minha escrita o cuidado com que guardo um pouco de tempo para mim mesmo, de vez em quando, e me reciclo, me recomponho, entro em faxina, ou, simplesmente, me encaro com alguns cuidados, por detrimento inevitável ao tempo e aos cuidados que, normalmente, dedico ao quotidiano e aos outros.

Frequentemente, nesta busca constante, descubro com agrado que já estava no meu rumo, fosse ele qual fosse, e que posso perseverar nele até que algo surja em contrário e mude o meu norte. Outras vezes, descubro que não, e que existe um o necessário ajuste – festivo, algumas vezes, sofrido e desagradável outras tantas.


Em todas elas, óbviamente, tem de prevalecer o homem, primeiro. O possível poeta, depois. E algum vago afastamento de permeio aos dois.


( 2008. REVISADA EM 2009 )




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