Todos os anos escrevo um texto, sem quaisquer pretensões literárias, mais ou menos por esta época junto ao Natal. Claro que o aproveitamento que faço dele, depois, determina como o olho ou ele é lido por outros.
É assim uma espécie de ponderação
sobre o ano que está já em vias de terminar, e que, normalmente, passou mais
depressa do que eu esperava. E que, ao
passar tão depressa, nem me deu tempo de colocar em perspectiva as coisas que
foram acontecendo.
Creio que isso acontece com
todos, em maior ou menor grau. Vamos
sendo requisitados pelos detalhes exigentes e mínimos do dia a dia, e vamo-nos
afastando da possibilidade de observar o conjunto maior, a grande imagem do que
está acontecendo.
Isto, até que a noção de que
estamos a ser empurrados dum lado para o outro se avoluma. E quando finalmente
conseguimos uma pausa para reflectir, o que estava acontecendo já aconteceu. O
que estava sendo, já foi. Porque o tempo, afinal, é isso mesmo. Só é nosso
enquanto o vivemos. Quando o olhamos já é passado. E falando dele, fica até
distante.
Mas eu gosto de ponderar sobre o
meu tempo, tentar lembrar com a isenção possível como o foi que o gastei, e
sobretudo com quem. E sempre que o faço, pensando a respeito, descubro
curiosidades que me enriquecem e que muitas das vezes desmentem a sensação vaga
que eu tinha de como havia sido o desenrolar do meu ano. E acabo, às vezes, por
descobrir que, afinal, foi diferente. Este ano ainda em curso é um bom exemplo
disso.
Não foi um ano diferente dos
outros. Teve as suas alegrias e as suas tristezas. Amigos que partiram de vez, e
outros que chegaram. Houve desafios superados, e outros que, de repente, surgiram
vindos quase do nada. E tal como de outras vezes, voltei a achar bom ter
superado os que superei, e ter assumido aqueles que assumi com o espírito firme
de quem quer vencê-los.
Na vida e na minha escrita, as
pessoas continuam a surpreender-me e a fascinar-me. E creio que não perdi a capacidade de me iludir com elas, ou de me desiludir. Mas sem dúvida são menos
as coisas que faço ou deixo de fazer por estar iludido ou desiludido.
Ao contrário do que algumas
pessoas parecem pensar, lidar de perto com a ficção e a fantasia, como faço na
escrita, não é o mesmo que lidar com a ilusão. Fantasia, é uma coisa e ilusão é
outra, bem distinta. E acredito que
cheguei a um ponto da minha existência em que me permito viver mais
tolerante com a fantasia, e sendo menos tolerante com a ilusão.
Fantasio, imaginando um mundo
melhor e mais bonito, onde seja melhor viver. Sinto isso com intensidade.
Serve-me de base para escrever coisas que quero transmitir. E porque não ? É
claro que não preciso iludir-me que isso vai acontecer, ou pelo menos acontecer
com facilidade.
Isso não me coloca na situação de
quem não tem ilusões, ou de quem já é um desiludido. Coloca-me, isso sim, na
posição de quem tenta manter uma posição de lucidez, mesmo permitindo-se
fantasiar. Porque não o faria ? Acaso deixaria de ajudar alguém apenas por saber
que talvez não me ficasse grato? Jamais.
Acredito que cada um faz o que
tem de fazer, e disso presta contas a si mesmo. E não que encontra o Céu ou o Inferno,
mais tarde. Mas vendo a felicidade de uns e a infelicidade de outros, decidi
acreditar que Céu e Inferno são aqui mesmo. E, em grande parte, resultado de
escolhas nossas. Escolhamos ser felizes.
O ano corre para o fim, e o novo
ano trará com ele soluções para problemas que ainda nem sabemos que temos. Alegrias
que nem sequer sabemos ainda serem possíveis. Reconhecimento por coisas que
ainda não fizemos. E junto virão momentos sofridos resultantes de escolhas
erradas, muitas vezes nossas. E outras vezes serão de outros, mas que, injustamente, nos
atingem. Virão coisas que eu gostaria que fossem diferentes, e que nem sequer
sei o que são ainda.
Mas o meu ano está a chegar ao
fim, tendo eu a convicção cada vez maior que o maravilhoso é isso mesmo: há em
tudo o que aprendemos, em todas as escolhas que fazemos com aquilo que
aprendemos, a possibilidade de
influenciar o nosso futuro e o caminho que nos leva até ele.
copyrightHenriqueMendes/2016
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